Por Esther Cristina Pereira*
Nos últimos anos, o debate sobre a inclusão escolar ganhou força. Garantir o direito de todos os estudantes à educação, respeitando suas particularidades, é um avanço necessário. No entanto, a prática nas escolas brasileiras mostra que ainda estamos distantes de uma inclusão plenamente efetiva. A escola, como primeira experiência social do indivíduo em formação após a família, deve garantir que o direito de todos seja respeitado. Pessoas com deficiência têm o direito de ser incluídas, e esse processo precisa acontecer de forma que também assegure um ambiente saudável e propício à aprendizagem para todos na sala de aula.
O avanço das legislações nos últimos anos trouxe conquistas importantes para o fortalecimento da inclusão escolar, com leis que asseguram direitos às pessoas com deficiência. Esse processo representa um passo relevante na garantia do acesso e da permanência de estudantes com diferentes necessidades no ambiente educacional.
Apesar desses avanços, surgem também novos desafios: tem sido cada vez mais comum o crescimento de diagnósticos em crianças em idade escolar que apresentam dificuldades como timidez, resistência à frustração ou barreiras de socialização. É importante lembrar que a verdadeira inclusão vai além de diagnósticos formais — ela precisa contemplar desde os estudantes com deficiências reconhecidas até aqueles que enfrentam vulnerabilidades emocionais, sociais ou afetivas, garantindo um ambiente escolar verdadeiramente acolhedor e equitativo.
A inclusão, do jeito que está sendo executada, tem deixado de ser um direito assegurado para se tornar um dever imposto, sem escuta, sem adaptação à realidade e sem suporte técnico. E isso tem adoecido as escolas. Ausência de apoio especializado, a falta do suporte familiar, escassez de profissionais preparados e um volume crescente de exigências legais criam um cenário de exaustão coletiva.
Enquanto as legislações avançam para garantir os direitos de alguns estudantes, pouco se discute sobre as necessidades de todos os que compartilham a mesma sala de aula. A impressão que se tem é de que, na tentativa de atender um grupo específico, o sistema tem deixado de lado aqueles que, por não apresentarem diagnósticos, acabam invisíveis diante das políticas públicas. E isso também precisa ser revisto. A escola precisa ser um espaço de acolhimento para todos, onde se possa aprender com qualidade, com respeito às suas diferenças, sem que um direito sobreponha ou inviabilize o outro, para criar um ambiente de aprendizagem coletivo e saudável.
É importante dizer que o que se questiona não é a inclusão, mas o modo como ela está sendo exigida, sem planejamento, sem diálogo com quem vive a sala de aula e sem olhar para os efeitos colaterais de um sistema que funciona na teoria. Enquanto isso, os professores adoecem. São eles que, na prática, precisam lidar com as crises emocionais, os conflitos diários, as múltiplas demandas de aprendizagem e a pressão institucional.
Estamos vivendo também um esvaziamento dos cursos de formação docente. O desestímulo à carreira é evidente. A pergunta é inevitável: quem vai querer ser professor nos próximos anos diante de um cenário tão caótico?
A escola tem sido chamada a resolver o que está além de sua responsabilidade: cuidar, alimentar, atender, acolher, adaptar e, se sobrar tempo, ensinar. Essa inversão de papéis compromete não apenas o rendimento pedagógico, mas o equilíbrio emocional de toda a comunidade escolar. A inclusão só será verdadeira quando for feita com estrutura, com responsabilidade e com respeito à complexidade do processo educativo.
É urgente repensar esse modelo, não para restringir direitos, mas para assegurar que sejam efetivados com qualidade. Não é possível manter uma política inclusiva se ela não for acompanhada de um respeito genuíno à diversidade de todos, e, sobretudo, ao projeto pedagógico da escola. Isso significa ouvir e valorizar o conhecimento sobre como implementar a inclusão, não apenas em relação a uma ou outra síndrome, mas promovendo a verdadeira inclusão das diferenças.
*Esther Cristina Pereira é pedagoga, psicopedagoga, professora, diretora da Federação Nacional das Escolas Particulares (FENEP) e diretora educacional instituto Destino Brasil.