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ENTREVISTA: Especialista da USP avalia questões sobre a Reforma Trabalhista

Professor considera que reforma não viola convenções internacionais da OIT

Olá, este é mais um Agência Entrevista. Nesta edição vamos conversar com o professor titular da faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Nelson Mannrich, para tratar da reforma Trabalhista, aprovada no ano passado e em vigor há cerca de seis meses. Nesta última semana, o ministro do Trabalho Helton Yomura esteve em Genebra, na Suíça, para tratar sobre uma série de assuntos ligadas à questão trabalhista, entre elas, rebater as denúncias de que a reforma trabalhista violava direitos trabalhistas e tratados internacionais.

Professor, gostaria de começar nossa entrevista falando da denúncia feita pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) contra a reforma Trabalhista sob a alegação de violar convenções internacionais. O assunto, inclusive, foi discutido durante a 107ª Conferência da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Genebra. Entre as denúncias apresentadas pela central sindical, está a de ferir direitos trabalhistas. Como o senhor avalia essa denúncia, ela tem fundamento?

Qual é o tratado que o Brasil não respeitou? Eu não sei, é uma denúncia muito ampla. Retirou direito dos trabalhadores? Violou normas fundamentais da OIT? Aí citam a Convenção 98. É uma situação delicada porque nós estamos tirando o debate do nível técnico, do ponto de vista jurídico, e colocando no ponto de vista ideológico, político. A OIT é um órgão técnico, tripartite. Ela tem espaço para empregadores falarem, empregados e o representantes dos Estados. Evidente que uma denúncia como essa poderia ser feita, assim como qualquer outra. Agora, caso haja alguma violação, isso me deixa muito surpreso. O que o Brasil deveria esclarecer para a OIT é de que até hoje não ratificou a Convenção 87, que é o fundamento da liberdade sindical e a base para os sindicatos negociarem, que é a base da reforma. O grande eixo da reforma é promover a negociação coletiva, que é uma das metas da OIT. Não é simplesmente entender que as regras que regulam empregado e empregador provém somente do Estado, da lei, não. Há um compromisso do Brasil de fomentar a negociação coletiva. Aliás, é isso que está na Convenção 98, que alegam estar sendo violada. Então, é muito difícil entender essa postura das centrais sindicais.”

Conversando com outros especialistas, vimos o questionamento sobre a CUT ter encaminhado a denúncia à OIT, em vez de seguir uma tramitação sobre a legalidade do texto no STF. Houve precipitação ou equívoco da CUT nesse sentido?

“Eu acho, sinceramente, que a OIT é um órgão tripartite. É um órgão de direito internacional, o Brasil é membro e como tal tem direito de ter sua representação lá. Tanto os trabalhadores, quanto empregadores e o próprio Estado tem acesso à OIT. Então, entendo que nada impede que a CUT faça a denúncia do que eles entendem que teve uma violação. Eu entendo que haveria necessidade de passar pelos órgãos internos. Se eu consigo que o TST declare inconstitucional algum dispositivo da reforma, acabou, é inconstitucional. Se o Supremo vier com uma das ações movidas aí para declarar uma coisa ou outra, ou toda a reforma, temos uma reforma inconstitucional. Não precisa ir para OIT. Foi o que falei para você, a OIT é um órgão político, não tem caminho prévio para seguir. É um direito legítimo que as centrais tem de bater à porta da OIT, eles estão lá representando os trabalhadores, e fazer o seu movimento de protesto. Agora, saber se isso realmente tem procedência e se a OIT vai acatar, precisamos aguardar.”

Professor Mannrich, o senhor acredita que a mudança na reforma Trabalhista, com relação à contribuição sindical – que passou agora ser opcional, pode ter influenciado a CUT a entrar com essa denúncia na OIT?

“Eu nunca pensei exatamente nisso. Eu penso sempre no direito legítimo que as centrais sindicais têm de levarem denúncias à OIT sobre abusos e descumprimentos de convenções internacionais. Agora, de fato, a reforma Trabalhista, que acabou com a contribuição sindical obrigatória, foi um golpe duro nos cofres dos sindicatos. Se nós levarmos por pressupostos de que os sindicatos têm um papel relevante, são importantes na governabilidade dos conflitos, eles exercem uma função que precisa ser remunerada. Nós temos que rever o financiamento das atividades sindicais. Agora como isso será feito? Eu acho que é mediante a negociação coletiva.”

Professor, estamos há pouco mais de seis meses com a Reforma Trabalhista em vigor. Na sua opinião, já podemos fazer uma avaliação sobre sua eficácia? O senhor acredita que os objetivos estão sendo alcançados, como diminuição de conflitos trabalhistas, por exemplo?

“Os conflitos não são evitados por lei. Os conflitos são evitados por modelos. Nós temos um modelo que apostava só na lei. Isso talvez seja um modelo conflitivo, por isso mudamos nosso modelo, apostando mais na negociação e, aí sim, evitar os conflitos. Eu acredito que a reforma Trabalhista aposta muito na negociação coletiva. Está muito cedo, evidentemente, mas nós temos uma análise que já pode nos dar alguns dados muito positivos. Se você analisar, por exemplo, o número de ações trabalhistas, diminuiu. Diminuiu por quê? O advogado trabalhista pediu para o cliente esperar mais um pouco? Ele quer se adaptar melhor a legislação? Ou, de fato, agora tem um inibidor. Haverá custos, litigância de má-fé. Nós não temos mais aquela situação em que eu jogo qualquer coisa no Judiciário, se eu ganhar bem, se eu não ganhar, não tenho nada a perder. É isso que estamos combatendo. Hoje há uma preocupação muito grande por parte dos advogados, tanto de empregados quanto de empresas. Por que se a empresa também apresentar uma defesa que não seja a correta, a devida é litigância de má-fé. Ela terá problemas assim como o empregado que usar o advogado para pleitear um direito que ele não tem. Eu acho que isso é muito positivo.”

 

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